A insistência nessa cena, das mãos lambuzadas de óleo, exigiria certos cuidados. Vale lembrar que sua utilização quando do anúncio da auto-suficiência revelou-se depois precipitada, porque essa conquista ainda demora mais um pouco. O mais preocupante, no entanto, é que o Brasil já produz petróleo no pré-sal desde os anos 1960, inclusive na bacia de Campos. O geólogo e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro Giuseppe Bacoccoli lembrou que os primeiros projetos na bacia de Campos, onde Badejo e Enchova produzem, desde o final dos anos 70, petróleo de reservatórios abaixo do sal, em condições idênticas às que são encontradas hoje em Jubarte. Os técnicos alertam que a grande novidade são os os volumes anunciados na área de pré-sal do campo de Tupi.
A emotividade da cena em alto-mar talvez tenha levado o presidente Lula a abandonar atitudes de maior comedimento e adotar frases fortes para comentar a inauguração do poço. Desse modo, se é válida a interpretação da maioria dos especialistas na área energética, o presidente Lula buscou prestigiar a Petrobras, citando os vultosos investimentos da estatal nos próximos anos, dizendo que a empresa precisará de mais de 200 plataformas para extrair o petróleo do pré-sal. E reafirmou que não adianta a Petrobras "economizar US$ 100 milhões contratando estaleiros de Cingapura, porque esta é uma decisão empresarial de quem tem ações na Bolsa de Nova York", insistindo em que a empresa deveria fomentar a indústria naval nacional. É uma observação estranha, porque, afinal, a Petrobras obedecerá ao sócio majoritário (a União tem pleno domínio acionário da companhia) e fará exatamente o que o governo mandar. Por outro lado, o presidente Lula, sem pôr um fim nas especulações sobre a criação de uma nova estatal para cuidar do pré-sal, criticou os que apregoam que a Petrobras será "abandonada", reafirmando com toda ênfase possível que esse esquecimento nunca acontecerá porque a estatal é "uma mãe para a indústria do País".
Porém, os problemas e dificuldades que cercam a extração de óleo na área do pré-sal são inúmeros e recomendariam uma atitude mais realista em relação ao que está em jogo. A linguagem, algo excessiva do presidente, também não contribui para equacionar essas dificuldades.
É preciso reconhecer que a Petrobras ainda não domina sequer todos os dados técnicos sobre Jubarte, que tem petróleo em águas rasas e perto da costa, com espessura bem menor, de apenas 200 metros de sal, contra, por exemplo, os mais de 2 quilômetros de Santos, onde está a reserva de Tupi, anunciada em novembro do ano passado. Nem em Jubarte, a estatal sabe exatamente o tamanho da reserva de pré-sal. Em Tupi, as reservas estão a mais de 6 mil metros de profundidade, abaixo de uma camada de sal de dois mil metros. E qualquer estimativa exata sobre o volume dessas reservas só poderá ser confirmada depois dos testes de longa duração, que avaliam o comportamento da jazida e medem o ritmo de perda de pressão dos poços e a mistura de óleo, gás e água. A Petrobras, aliás, já reuniu experiências desagradáveis suficientes de promessas que não se realizam, como a perda de pressão do poço de Golfinho, para citar um caso recente.
Na exploração do pré-sal há enormes custos envolvidos, desde as prospecções inciais. O presidente Lula está correto ao insistir que essa riqueza pertence ao povo brasileiro e que será preciso rever a distribuição de royalties aos municípios para evitar os desperdícios que já se acumulam com as atuais reservas do País, duas tarefas de dif´ícil execução. Portanto, com tantos motivos para cautela, com tantas dificuldades à frente, linguagem voluntariosa e excessiva pode e deve ser evitada.
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